Destinatário: nós, os sequestradores de mágoas


Novembro: uma carta de perdão

Libertação em caso único e exclusivo, com o perdão.
Recompensa: sua felicidade de volta.

Me veio em mente uma teoria nova. Talvez as crianças sejam mais felizes não por não terem obrigações (o que não é exatamente uma verdade), mas sim, por não guardarem o que lhes causou alguma dor (na grande maioria das vezes).

Quem é que não sabe que com criança algo dói, ela reage a aquilo, fica chateada por um tempo e depois passa? A visa segue, geralmente ela vai brincar ou fazer algo que a divirta. E não é pra esquecer a dor, é por ela já ter sido esquecida. E ela não tem medo de tentar novamente, pois ela escolheu ser livre. E vai atrás, sem expectativas. Sem pensar em como pode ser. Ela escolheu perdoar e deixar ir. Criança não é apegada a essas coisas. A gente que ensina a elas a se apegar, pois quando adultos, somos medrosos. Assim, a felicidade se aconchega com mais facilidade quando somos crianças e ainda não desaprendemos o básico para se viver de forma saudável. Afinal o novo só chega quando tem espaço, né? E quando a gente não tem medo dele.

Mas passando da infância, a gente chega na adolescência e os nossos nervos estão à flor da pele, a gente quer descobrir quem a gente é e não o que dizem o que a gente é ou deveríamos ser. A gente quer experimentar e é ai que as coisas começam a se complicar. A gente descobre a hipocrisia que nos foi imposta e é difícil não se rebelar, nem que seja um pouco, contra isso.

E assim, esse dom de perdoar entra na maioria das vezes, numa escassez que demora para voltar ou que quase nunca volta por completo. Aquelas mágoas que a gente deixou de lado na infância, começaram a serem revistas e suspendemos alguns perdões. A paz deixa de reinar. O passado começa a pesar, pois trancamos as piores partes dele dentro da gente (nos maltratamos tanto, né?). Além do que a gente começa a acumular dentro da própria adolescência e assim, não há felicidade. Pois não há paz nem calma para buscar por felicidade. Acumulando coisas ruins do passado, o novo não tem espaço para chegar. E assim, tudo para.

É normal. Quem não passa por isso? A gente ainda não tem maturidade e certas coisas são impostas mesmo e só estamos começando a buscar alternativas diferentes agora. Mas o fato é que, creio que nossa vida passa a nos pesar tanto, pois temos todo esse apego com as nossas dores. A gente sempre se apega ao que fizeram de ruim conosco e isso algumas vezes, acaba pesando mais do que a gente imagina. E pesa, viu?

Quando a gente chega na fase adulta, a gente vai acumulando ainda mais, ficando cansado, ficando decepcionado, nos pegamos em situações inimagináveis até então. E quanto mais a gente fica preso nisso, mais a gente vai se embolando... Por isso eu acredito que a diferença entre a leveza da criança e o engessamento dos adultos, nem tem haver com obrigações. Tem haver com perdão. Tem haver com desapego. Tem haver com deixar fluir. O novo só vem quando o mais velho se vai. E nós vamos desaprendendo isso com o tempo, ficando cada vez mais duros, enferrujados, doídos. Cada vez mais presos e com menos mobilidade. Óbvio que assim, não vai facilitar em nada nossa vida. Pelo contrário: fica mais difícil. O ombro pesa, o coração pesa, o olhar cai. Não facilitamos em nada na nossa vida.

Nós sequestramos o que passamos de ruim e guardamos dentro de nós. Nos fazemos de lixos emocionais de nós mesmos. E nós não deixamos cair no esquecimento. Tem vezes que queremos até dar o troco, de tanto que aquilo já enraizou em nós. Só que isso não traz a nossa paz de volta, talvez acabe nos atormentando ainda mais. Tão diferente de quando éramos crianças, né? A gente brigava, chamava o outro de burro, o outro nos chamava de lesma, a briga chegava no ponto máximo e depois de um tempo estava tudo bem. Qual o peso para se levar disso? Nenhum.

Olha, humano. Eu sei que ai há mágoas. Há rancores. Há um passado com amarguras. Foram coisas que aconteceram e você guardou ai, no seu peito. Mas deixa eu te contar o que eu vejo. Seu sequestrador... é você. Seu libertador... é você também. Por incrível que pareça. Ainda que pareça a salvação ter vindo de outro lugar, ela na verdade, sempre vem de você. Não foi o remédio, não foi a missa. Não foi o médico, não foi o padre. Foi você. Com esse passado só a gente pra lidar. Com ajuda sim, caso se faça necessário. Mas quem decide é quem sequestrou a mágoa: você. Se o cativeiro é seu, a chave também é sua.

Se permita o perdão. Se permita deixar de ser cativeiro, sequestrador e refém de si mesmo e tudo isso numa equação só. A vida pode ser mais leve. A vida pode ser mais fácil. Basta aprender a lidar melhor com o que te aconteceu. Basta reaprender a habilidade que na verdade, nasceu com você. E ela ainda está ai, encontre-a.

Ana Débora, com carinho e gratidão

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